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Você já ouviu falar do caso do sequestro de Poitiers?
É uma história sinistra que rolou na França em 1901 e envolve a pura crueldade humana.
O caso ganhou a fama como “O sequestro de Poitiers”.
Tudo aconteceu com a senhorita Luz Blanche Monnier (mais conhecida como Blanche Monnier), onde a própria mãe e o irmão foram responsáveis por aprisionar a jovem por 24 anos (não se sabe ao certo se a jovem passou 24 ou 25 anos presa).
De fato, o caso de cárcere privado imposto pela própria família já é algo abominável, mas as condições em que a vítima se encontrava quando a polícia descobriu o cativeiro tornaram tudo ainda mais chocante e absurdo.
Você deve estar se perguntando “porque esses otários prenderam ela por tanto tempo?” Acontece que os familiares da jovem não concordavam com o relacionamento dela com um homem mais velho e pobre. Infelizmente, por isso.
A denúncia que tornou o caso público
No dia 23 de maio de 1901, o procurador geral de Paris recebeu uma carta anônima denunciando que uma mulher estava sendo mantida em cativeiro em uma casa localizada na rua 21 no bairro de classe alta de Poitiers, na capital francesa. A carta dizia:
“Monsieur Procurador-Geral: Tenho a honra de informá-lo de uma ocorrência de excepcional gravidade. Falo de uma solteirona que está presa na casa de Madame Monnier, ela passa fome e vive em uma cama podre nos últimos 25 anos – em uma palavra, em sua própria sujeira”.
A carta surpreendeu ao procurador e aos policiais que iriam até o local averiguar as denúncias feitas pelo documento, afinal as acusações recaiam viúva Louise Monnier Demarconnay, que vivia com seu filho Marcel Monnier.
Os Monniers eram uma família de classe média alta. O marido de Louise, Charles-Émile Monnier, havia sido um importante membro da faculdade de artes local, mas faleceu em 1882 (algumas fontes afirmam que sua morte aconteceu em 1879).
Marcel era licenciado em Direito Escolar, tendo sido vice prefeito de Puget Théniers. No passado a família até havia ganhado um prêmio do Comitê de boas Obras. Esse prêmio era dado a cidadãos que se destacavam na sociedade apresentando grandes virtudes.
A família era composta também por Luz Blanche Monnier, uma jovem descrita como “alegre e brincalhona”, dotada de uma “belo cabelo e olhos grandes e brilhantes”, mas a jovem havia desaparecido do convívio social quando tinha apenas 25 anos de idade.
A polícia descobre o cativeiro
A polícia chegou à casa, arrombaram a porta e encontraram Blanche Monnier em um estado esquelético deitada em uma cama, rodeada de fezes e restos de comida. O pequeno cômodo ficava no andar superior da residência da família Monnier. A mulher estava escondida debaixo das cobertas, nua e muito assustada, além de extremamente desnutrida – ela estava pesando apenas 24,9 kg quando foi descoberta. Blanche estava com 49 anos.
Um policial que participou da ação descreveu a libertação de Blanche da seguinte maneira:
“Nós recebemos a ordem de arrombar a porta do quarto. Isso foi feito com grande dificuldade, o local possuía pesadas e antigas cortinas escuras, cobertas de poeira. Para abrir as persianas das janelas, foi necessário remover as dobradiças. Assim que a luz entrou no ambiente, percebemos deitada em uma cama, com a cabeça e o corpo cobertos por um cobertor imundo e repulsivo, uma mulher identificada como a senhorita Blanche Monnier. A infeliz mulher estava deitada completamente nua em um colchão de palha podre. Ao seu redor se formou uma espécie de crosta feita de excrementos, fragmentos de carne, legumes, peixe e pão podre. Vimos também conchas de ostras e insetos que atravessam a cama da senhorita Monnier. O ar estava totalmente pestilento, o odor exalado pelo quarto era tão patente, que era impossível para nós ficar mais tempo para prosseguir com nossa investigação.”
A saúde de Blanche
A mulher apavorada foi envolvida rapidamente em um cobertor e levada às pressas para o Hospital Hôtel-Dieu, em Paris, onde os médicos acreditaram que ela dificilmente sobreviveria. A mãe de Blanche foi encontrada sentada calmamente na sala de estar vestida com um roupão decorado com pequenos quadrados pretos e brancos. Um pouco assustador, fala sério!
No hospital as enfermeiras e médicos observaram que Blanche aparentava sentir grande prazer ao receber banho e a respirar ar puro. Ela teria exclamado: “Como é belo”. A equipe médica também notou que ela possuía uma grande aversão à luz, afinal de contas ela havia passado mais de duas décadas trancafiada em um cômodo escuro. A foto que ilustra essa postagem foi tirada logo que Blanche deu entrada no hospital.
Quando interrogado pela polícia o irmão de Blanche afirmou que ela era louca e muito agressiva, sendo muito difícil lidar com ela, por isso que ela estaria em uma situação tão insalubre, mas no hospital os médicos definiram o comportamento de Blanche como “calmo”, eles em momento algum registraram qualquer ataque de raiva ou agressividade.
Os motivos do cárcere
Com o avanço das investigações por parte da polícia, o motivo que levou a reclusão de Blanche Monnier começou a vir à tona (embora alguns questionamentos permaneçam um mistério até os dias de hoje).
Quando Blanche tinha pouco mais de 20 anos de idade, ela se apaixonou por um advogado um tanto mais velho que ela, sendo que ele teria um filho inclusive. A mãe de Blanche foi contrária ao romance, pois segundo a visão de Louise, Blanche sendo de uma família proeminente da sociedade local, ela não poderia se relacionar com ou homem mais velho, pobre e que já tinha um filho. Blanche teria se recusado a manter distância do seu grande amor, e planejava se casar com ele mesmo que isso significasse contrariar sua mãe.
Sabendo dos planos de Blanche, Louise acabou trancando a própria filha em uma sala no andar superior da casa, até que ela desistisse de se casar. Louise imaginava que a jovem fosse ceder em poucas semanas e concordar com suas exigências.
O tempo passou lentamente para Blanche, que passou os próximos 24, ou 25, anos trancada na sala, que se tornaria seu quarto, e sua cela.
O irmão de Blanche, Marcel, diria mais tarde que Blanche estava louca, e nunca tentou escapar do quarto fechado. Mas de acordo com depoimentos no tribunal, várias testemunhas afirmaram que muitas vezes ouviram Blanche gritando e pedindo ajuda, algumas vezes mencionando palavras como “Polícia”, “pena” e “liberdade”. Em 16 de agosto de 1892, uma testemunha ouviu Blanche gritar as seguintes palavras:
“O que eu fiz para ser presa? Eu não mereço essa tortura horrível. Deus não deve existir, por que deixar suas criaturas sofrem desta forma? E por que ninguém vem em meu socorro!”
As testemunhas afirmaram saber do cárcere de Blanche, mas disseram não imaginar o estado em que a jovem estava sendo mantida presa.
Prisão e julgamento
A mãe de Blanche, Madame Monnier de 75 anos, foi presa no dia seguinte a descoberta do caso. Uma multidão agitada se reuniu nas proximidades da prisão com gritos de ódio e vingança. Madame Monnier foi imediatamente colocado na enfermaria (ela sofria de doença cardíaca), onde ela inesperadamente morreu 15 dias depois. Dizia-se que suas últimas palavras foram ditas aos médicos que entraram na sala momentos antes de ela morrer. Eles lembraram que ela exclamou: “Ah, minha pobre Blanche!”
Marcel foi julgado sozinho, acusado de ser cúmplice de sua mãe. O julgamento foi iniciado em 07 de outubro de 1901, quatro dias depois, Marcel foi considerado culpado e condenado a 15 meses de prisão. O veredito em 11 de outubro foi aplaudido na sala do tribunal. Na Praça do Palácio, a multidão mostrou a sua aprovação, gritando inúmeras ameaças hostis ao homem condenado.
Em 20 de Novembro de 1901, Marcel recorreu da decisão, alegando que nunca havia causado qualquer violência à irmã. Marcel afirmou várias vezes que a irmã era louca, e segundo ele, sua intenção era internar a irmã em um sanatório, porém a mãe achou degradante a condição, ainda mais para uma família de classe como eles eram, afinal naquela época instituições psiquiátricas eram verdadeiros depósitos de pessoas que “envergonhavam” os parentes ricos.
Durante o julgamento do recurso formam apresentados laudos que afirmavam que Blanche sofria de transtornos mentais como: anorexia histérica, coprofilia e exibicionismo. O recurso foi aceito, e assim, Marcel ganhou a liberdade.
A decisão gerou grande discussão, pois parte da aceitação do recurso solicitado por Marcel se deve ao laudo que afirmava que sua irmã sofria de distúrbios mentais, porém tal análise foi feita após Blanche ter passado 24 anos presa em um quarto. Esse período presa certamente debilitou sua mente. A analise deveria ter sido realizada levando em conta a situação dela quando ela foi trancafiada pela família, como isso não era possível, tal alegação deveria ter sido desconsiderada.
O fim do sofrimento
Logo depois de libertada do cárcere, e após receber os devidos cuidados médicos, Blanche recuperou peso, melhorando sua condição física, mas ela nunca mais recobrou sua sanidade. Luz Blanche Monnier acabou falecendo no hospital psiquiátrico de Blois no anos de 1913, 12 anos depois de ter sido resgatada do seu cativeiro.
Perguntas até hoje não respondidas
Quem enviou a carta?
Há duas teorias a respeito de quem enviou a carta anônima que notificou as autoridades a respeito do cativeiro de Blanche. Inicialmente pensou-se que o próprio irmão de Blanche havia enviado a carta. Sabendo que sua mãe estava perto da morte, ele teria enviado a carta para que sua irmã fosse resgatada, antes dele ter que se tornar o único responsável por ela.
A segunda hipótese fala que um ex soldado que ajudou uma das criadas da família, mas que não tinha qualquer tipo de lealdade com os Monniers, teria sido o autor da carta que alertou a justiça para a situação em que Blanche Monnier se encontrava.
Suspeitou-se que a primeira carta anônima tinha sido enviado por seu irmão. Sabendo que sua mãe estava perto da morte, é suposto que ele enviou a carta para que sua irmã seria resgatada antes de se tornar seu único zelador. Mais tarde, pensou-se que um ex-soldado que ajudou uma das criadas, mas não senti nenhuma lealdade para com a família, tinha enviado a carta para as autoridades. Quem enviou a carta continua a ser um mistério.
Variantes do nome da vítima
O nome da mulher cativa era Luz Blanche Monnier. Em documentos históricos, o nome dela era frequentemente alterado para proteger sua identidade. Alguns autores mencionam seu nome como sendo Melanie Blanche. Na maioria das fontes, o nome mencionado é apenas Blanche Monnier. Segundo um texto que encontrei na Wikipédia francesa, na época que o caso veio a público, muitas crônicas no país afirmavam que o nome da vitima era Melanie Bastian. Isso foi feito para proteger a identidade da mulher, pois os jornais acreditavam que se ela sobrevivesse e voltasse ao convívio social essa proteção seria necessária para não expor demais a sua intimidade.
O pai da garota sabia de tudo?
Blanche foi presa por volta do ano de 1877 pela sua mãe e pelo irmão, mas nessa época seu pai ainda estava vivo. Qual a participação de Charles-Émile Monnier, que faleceu em 1882, no caso? A polícia nunca questionou Marcel a esse respeito, então a participação do patriarca da família no caso nunca chegou a ser estudada.
Como já mencionei mais acima, existem duas versões para o ano da morte do pais da vítima. A versão encontrada em textos de sites franceses afirma que essa data seria 1882, porém textos encontrados em sites dos EUA afirmam que a data da morte de Charles Monnier teria acontecido em 1879. Eu optei por considerar a versão francesa mais verdadeira, afinal o caso aconteceu naquele país. Embora esse dado não tenha grande importância para a história, julguei necessária tal explicação.
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Fonte: Noite Sinistra, Não Kibo e Altered Dimensions.